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Foto do escritorliardomingues

O RETORNO (DE SATURNO) – OU O VALE ME VÊ SEM MÁSCARAS

Fazia alguns anos que eu não chorava de amor. Dia desses, chorei. Chorei pelos desencontros, pelos recomeços frequentes, pelo cansaço de morrer e renascer tanto.




Faz dois anos que decidi morar no Vale do Capão, na Chapada Diamantina/BA. Alugar casa, ter contas fixas e guardar a mochila no armário. Na prática, apesar de ancorada, sigo viajando muito. Viajei pelos últimos sete meses e o retorno pra casa me ajudou a chorar. Que vazio, meu Deus, este retornar sete meses depois...


Eu mudei. E o que ficou também mudou. A casa está sete meses mais velha, assim como a moto, a cama, as cobertas e a gata. Quem morava comigo já não mora mais. As plantas do quintal cresceram e a tentativa de horta não sustentou o estar só.


Coube muita coisa nesses sete meses: visitei a roça em Canudos, caminhei 200km no norte de Minas com @ocaminhodosertao, vi o Encontro de Culturas Tradicionais da Chapada dos Veadeiros, acompanhei a morte de minha avó, plantei sementes em Brasília, fiz um retiro de sexualidade e morei três meses na praia.


Eu já moro na Bahia há três anos, mas só há pouco é que cheguei no mar. Feito mãe, Janaína me recebeu com braços quentes e águas mansas. O mangue esteve ali, em testemunho. Nanã: é vovó quem me ensina e me dá bons amores de presente.


Os três meses de praia me fizeram chegar farejando sal pelas montanhas da Chapada e achando tudo muito frio. A praia, tão mutante com suas marés, falou-me sobre estrutura. Quis dar as mãos e ter companhia pro corre da vida. De novo, projetei sonhos em outras pessoas. Mas peguei-me no pulo do gato! A tempo de calibrar-me para ver o outro como ele é. Para tentar estar comigo em paz. Para confiar que o Caos é tão amoroso e navegável quanto a Ordem.


Talvez eu seja como muitas pessoas daqui: alguém que se reveza entre morar no Vale por certa parte do ano e viajar por outra. O ar das viagens se choca com minha terra de dentro. Encho-me de dúvidas nas transições e desconfio da sabedoria da vida.


É preciso paciência até que eu me lembre da potência que o Vazio tem. Vácuo. Útero oco, escuro e só: a re- criação está aqui, tão grande quanto meu próprio punho.


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Caeté-Açu, 03/03/23

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